Miniconto 40* - Pré-Campanha

Todo santo dia se lamentava. Por que as barras de apoio do ônibus eram tão altas? Afinal, parecia que todos ali abominavam um desodorante.

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Miniconto 149* - Ciclo

Casou.

Coisou.

Cansou.

Causou.

Cessaram.

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Ensandecer

Quarta feira, vinte e três horas e quarenta e cinco minutos de uma noite gelada em São Paulo. Sentadas nos bancos frios, as pessoas se recostam em seu espaço como podem, ou acotovelam-se no corredor cheio de mochilas e pastas. Estudantes, na certa. Eu também. Transporte público não é muito divertido, principalmente quando você está perto de desabar de sono ou cansaço, depois da batalha diária. Mas, naquele dia, ao menos alguma coisa aconteceu. Alguma coisa que despertou alguns da sonolência, irritando-os. A mim, apenas divertindo. Até que enfim. Sentado no banco do motorista, o homem inquieto apertava cada vez mais o fone no ouvido, talvez na esperança que pudesse fazer parte do universo que ouvia; então, durante as manobras nas curvas molhadas pelas quais direcionava o ônibus, ele gritava, num surto de emoção visível em seus olhos repentinamente arregalados: - TIRA ISSO DAÍ! ….ACABA LOGO COM ISSO PELO AMOR DE DEUS! Eu ria. Me divertindo com o nervoso do homem, que, no limite das possibilidades, dava pulos em sua cadeira e se mexia sem parar. Alguns passageiros reclamavam aos sussurros da imprudência do homem. - Como ele pode dirigir desse jeito? Vai acabar batendo o ônibus! - Gente assim não tem jeito não … é doença. Foi nessa hora que eu me dei conta da loucura do homem. Não a loucura que era dirigir um ônibus enquanto envolvido em outra atmosfera (ele quase parecia cego), mas a loucura que o fazia dirigir um ônibus, mesmo totalmente disperso. Devia ser doença mesmo, loucura das bravas!Eu nunca via pessoas tão apaixonadas por uma coisa daquele tipo, dava pra ver que a tensão que emanava do motorista envolvia cada um que fazia parte da “espécie”, inclusive eu. Bipolaridade talvez? Quem sabe… - SAI, SAAAI! … UUUUUHH! AÊÊÊÊ, JÁ DEU! JÁ DEU! 3 MINUTOS? PUTA MERDA! Os três minutos seguintes, pareceram durar 10, pra mim. O coitado devia estar com a sensação que duravam, pelo menos, mais 45min. - AEEEEW JUIZÃO! ACABOOOU! TAMO NA FINAL ! VAAAAI CORINTHIANS!!! “AQUI TEM UM BANDO DE LOUCO ….” E a gritaria durou até que eu deixasse o ônibus, sorrindo com a situação, e com o alívio de saber que tudo tinha acabado bem, pelo menos aquela noite. O homem, ah, ele não estava sozinho apesar de sua voz ser a única a explodir naquele espaço, pelo menos mais 25 milhões de corações espalhados pelo Brasil gritavam o mesmo hino, a mesma vitória. Deitei-me aquele dia ainda com a cena em minha cabeça, o sorriso no rosto e uma música de fundo que dava o tom perfeito pro acontecimento. ♪ “…. eternamente, dentro dos nossos corações …” ♪

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Carta de uma jovem velha

Não sei se poder inconsciente de um livro, ou fato consciente da vida, hoje descobri: sinto-me uma velha. Dessas que viveram à toda atrás de um amor, ainda que aqueles de verão. Invejo quem pode se apaixonar, sem vergonha do colorido das palavras, do sustenido do coração… tão óbvio, tão adolescente. Um coração quente que não se pode gelar, nem pela morte. Sinto-me uma velha ao observar o comportamento dessas crianças, sempre radiantes, combinando com os dias intermináveis de sol . Enquanto eu, aqui, sentada a olhar as nuvens sem forma, o ar denso e triste, os passos apressados dos corações descompassados de tanto amor. Meio século se passou desde o primeiro beijo apaixonado, e nada é como se fosse ontem, mas sim como um futuro do passado. Assim: tão trágico e sem esperança. Sinto-me uma velha com esses olhos insóbrios de tanto esperar. Uma velha escondida entre os tantos romances avassaladores e eternos. Aqui, sentada, regando com esforço o hedonismo nas madrugadas de saudade.

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