Valentina, 16 anos, Engenheira de Aviõezinhos de Papel.
- Gessica Borges
- Nota , Contos , Contos , Engenharia , Filosofia
- September 15, 2014
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Acordou aquela manhã e leu sua bio do blog repetidas vezes, como que com dificuldade de entender a frase que outrora era a descrição perfeita de si mesma: “Só sei que nada sei”.
Sócrates era o seu filósofo grego favorito, não pela premissa de busca constante pelo conhecimento através do questionamento, mas porque ela gostava da ideia de não precisar se esforçar para dizer que sabia das coisas, quando sabia tão pouco. Tímida e reservada como era, sonhava alto com planos baixos e achava que tudo bem ser assim, porque 1 – era melhor criar e cuidar de seu próprio mundo do que tentar viver no mundo dos outros 2 – quanto menores os desejos, menores os tombos e 3 – não havia nada mais significante no fato de viver do que isso estar intrínseco ao fato de ter uma vida (as pedrinhas decorativas de sua janela concordavam).
Ainda que satisfeita com sua autodefinição limitada (e um tanto incerta), decidiu que precisava de uma frase que expressasse algo que ela realmente era. Nada de “uma garota muito legal” ou “garota de 16 anos à procura da felicidade” e essas babaquices todas que não dizem nada. Precisava de algo puramente exclusivo. Algo que ela pudesse defender com garra e dizer “é, eu sou isso mesmo!” e talvez, usar num cartão de visita quando fosse adulta.
Ficou mastigando algumas ideias por uns minutos, enquanto escutava música e trabalhava no nobre ofício de fazer aviõezinhos de papel.
Daí começou a acontecer uma coisa engraçada.
Quanto mais tentava se concentrar na frase, mais se preocupava com a simetria e design do aviãozinho. Dobrou e desdobrou o papel pelo menos sete vezes antes de conseguir juntar as pontas com perfeição. Depois recortou várias figuras coloridas, juntou as canetas que tinha e resolveu fazer uma mistura surrealista para decorar as asas. A base pintou minuciosamente com canetinha. Curou a obra como se a peça mais importante da sua estante criativa.
De repente, soltou o aviãozinho, escancarou os olhos para tela do computador e lutou para conter o sorriso entusiasmado. Começou a digitar sua nova bio e pensou com algum pesar em Sócrates e em sua filosofia. Assim, de repente, “eureka!”, e Arquimedes mudou a sintonia.